terça-feira, 23 de novembro de 2010

Angústia

E com batidas aceleradas, ia remoendo e mastigando a dor que o consumia, como se as lágrimas que estavam presas ali, assim tivessem que permanecer, já que não conseguia mais pensar na dor como algo que o fizesse se sentir vivo.

A alma cansada do sofrer alheio e do próprio aos poucos ia sucumbindo, deixando um vazio na mente que horas e outras ia sendo ocupado por lapsos de pensamentos que aparentemente seriam a única saída. Já não resistia mais o corpo daquele que ante os problemas se mantinha firme e imutável, sem se que uma gota a menos.

O querer juntar-se as sombras ia aumentando gradativamente a cada lento minuto que deixava de passar, e que nenhum sinal era dado, para surgir novamente a esperança do estar errado.

A saudade consumia-o ao mesmo tempo em que a amargura e a angústia fulminante acompanharam-no, passo a passo, pelos 1.440 minutos que ele manteve o pensamento atento ao que, a todo custo, tentou esquecer naquele dia.

Não chovia, não por fora, mas a tempestade que o afligia era sem dúvida mais dolorosa e cruel que qualquer intempérie física. E os raios que caiam, se quer tocavam o chão, pois voltavam-se ferozmente para dentro de si.

E quantas outras vezes pensou em esconder o choro sob a água fria do chuveiro, mas manteve-se ali, inerte letra após letra, gole após gole, sem uma gota derramada, não por orgulho, mas pelo cansaço do passado que achou perdido como um livro velho que à muito não era aberto.

Não chorou, agiu apenas como se apenas estivesse recapitulando os fatos. Pensou mil vezes e nenhuma delas o impediu de baixar a guarda, o que mesmo assim, de nada adiantou, já que no dia, ninguém, esteve presente para aplicar-lhe um direto de esquerda que o deixasse com a vista embaçada e o queixo dolorido. Sofreu pelo não sofrer. Sofreu pela incerteza do que achou certo mesmo sem querer, mais que agora era o que menos desejava.

Restou-lhe apenas o adeus, nada mais que o gosto ruim e a solidão da semi-luz, que iria, pelo visto, acompanhá-lo fielmente pelo resto do caminho que decidiu percorrer.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

E entre a garrafa meio cheia, e o copo quase vazio, a solidão era quebrada apenas pela voz tocada em notas e sons roucos e distorcidos.

A aflição do estar só era aos poucos suprimida pelo sono, e pela pilha de papeis sobre a mesa à espera de uma coragem que não chegava, mas que pouco importava diante do real motivo de não dedicar-me as palavras miúdas e do trabalho cansativo de obrigações que acho cada vez mais incondicionais ao que me vi a fazer no passado.

A dor sim, essa era o ponto que tanto oscilava e remoia-se dentro do meu eu enquanto ardia a garganta ao ser tocada pelo malte envelhecido. Era ela, essa dor, que me impedia de pensar, e mesmo na obrigação, mantinha-me mais uma noite em claro, o que me renderia certamente olhos fundos e lagrimas secas na manhã seguinte.

A solidão não doía pelo agora, não apenas por ele, mas martelava e perfurava com a força de uma vida que pendia sobre a faca para que até o talo de sua lâmina alcançasse o mais profundo dos cantos do que já nem achei que existia. Era uma dor que chorava por saber ser real, pelo saber que em outros tempos já estivera ali, presente, e que agora insistia em voltar e se mostrar com sorriso torto de quem embriaga-se no sofrimento alheio.

Seca mais um copo, vai-se mais da garrafa, mas nada suficiente para afogar-me, não ainda, não desta vez, mesmo que a dúvida sobre o querer persista e fique acenando e gritando no fundo pensante.

Ouço cada palavra, é como se em cada letra diferente, com ritmos diferentes, estivesse presente o mesmo assunto, a mesma tecla batida, o mesmo acorde desafinado que mancha o papel pautado de notas acertadas.

[...]

“Ponho meu sapato novo e vou passear sozinho, como der, eu vou até a beira, besteira qualquer”

- Los Hermanos.